Coisas

maria
3 min readMar 14, 2021

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06/10/2018

esse texto fala sobre muitas coisas. fala sobre o presente, que é muitas, porque engloba mais coisas que o passado, que não o contém, e o futuro, que também não. o futuro imaginado tem seu presente vazio, então não pode ser nada senão um passado que ainda virá.

hoje mexeram com meu pé mais uma vez. não foi um pisão, tava mais pra uma engancho-mochilada; mas quando a gente fica atento com as repetições de forma um pouco sincrética, os segundos sóis não são mais meras notas musicais, mas a crença em um alerta.

não é como se meu pé estivesse ali estirado, completamente vulnerável. lembro bem, estava de pernas cruzadas, quero dizer, quando voce coloca uma perna em cima da outra em forma de uma trança. é uma pose de adulto, de defesa pessoal: o pé de cima cria um semi circulo de proteção do pé vulnerável a pisada, enquanto ele, titubeando pelas altas altitudes, se mostra mais visível aos olhos e corpos intrusos.

uma pose deveras cautelosa assim nao devia ter sido alvo de um ataque objetivo de uma mochila arrastada pelas mãos de uma colega. já há tanto que eu não me mostro vulnerável, que eu me escondo. como as pessoas conseguem tirar meu cobertor, se eu mesma as 8h da manhã nao consigo e tenho que fingir mal estar no grupo do trabalho?

a gente não se percebe, né. não se ouve. porque tem várias coisas que entram nesse número de coisas que eu pensei hoje, e agora não se mostram porque nao foram ouvidas corretamente por mim. pensamentos que vão ter que se repetir em alguma ordem, porque eu pisei em seus pés. e se a gente mesmo nao se ouve, nao se toca, quem dirá que os outros se tocarão…

logo agora, quando eu marquei em meu pé um desenho tão cheio de significados. um simbolo da minha atuação na vida que se manifesta nas mais diversas esferas possiveis — hoje, inclusive, me apareceu como incerteza e duvida- logo agora que a musica é parte das minhas cicatrizes, porque querem pisar nela?

ao mesmo tempo, outros símbolos em marcadas conversas entre eu e mim mesma. como que alguém que se julga adulta por sentar em poses de adulto e buscar se defender tanto pode ter tanta incerteza de quem vai votar?

é coisa de primeira vez também que esse texto fala. coisa de poder errar porque é a primeira vez que participa ativamente do jogo eleitoral, coisa de pela primeira vez se perceber tao acoada a ponto de não conseguir fazer pequenos bens cotidianos, coisa de pela primeira vez de se tocar que tem um anjo do seu lado, uma pessoa que te faz bem como ninguém nunca fez. é, porque ser adulto não é só coisas ruins.

se é que isso é ser adulto né. mas enfim, voltando a coisa.

como que uma frustração foi capaz de me tirar o fôlego? de perder a iniciativa, a fala, que era uma coisa que vinha de dentro e não parava pra pensar duas vezes? porque que eu aprendi a desconfiar dos outros sob a forma da falta de vontade? no começo do ano, sabia que seria um ano de respiro, de auto-cuidado, mas o se fechar nao pode cair num buraco muito maior do desprezo, do não ver?

me pego sempre nisso, com medo de não ver, não ouvir. porque eu nao fui ouvida por muito tempo. nao só nao ouvida, mas tive que cantar baixinho porque chamava atenção, as pessoas se utilizavam disso ou criavam disso um motivo pra ir embora. porque falar está associado a perda? a julgamento? porque a voz do outro é tão importante na minha decisão final?

esse pensamento do ciclo

nao sai da minha cabeça

como as flores de ipê

não saem da calçada

será que não é só o ciclo brasileiro que é tão previsível? a exaustiva repetição de pessoas pisando no meu pé, pisando nos meus sonhos, nao é um projeto dos desgovernos de mim? o dar a volta em coisas e não mudar nada, que nem eu faço agora, terminado pelas eleições diretamente proporcionais e comparáveis com o passado, o voto no amargo, no ódio e não na crença, mais contra que a favor; que desserviço eu faço cotidianamente?

acho que é hora de abrir mão, aprender a cair, muito mais dificil e necessario que aprender a lutar.

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